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Baseado em uma crônica de: Luiz Fernando Veríssimo
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Nesta altura da vida,
Eu já não sei mais quem sou.
Se já era complicado,
Agora é que complicou.
Depois que um analista
Calmamente me explicou...
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Vejam o que ele falou
De forma bem convincente.
Ele disse: que na loja
Onde eu compro, sou cliente.
No restaurante um freguês,
Nos correio, remetente.
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No hospital, sou paciente,
Se ouvir rádio, eu sou ouvinte.
Na receita federal
Eu sou um contribuinte.
Viajando eu sou turista,
Mendigando, eu sou pedinte.
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Se eu for homem de requinte,
Vão me chamar de grã-fino.
Morando em casa alugada,
Não passo de um inquilino.
Se não cumpro sou moleque,
Fazendo o mal, sou malino.
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Com dez anos, sou menino,
Com cinquenta, sou senhor.
Para o dono do mercado,
Eu sou um consumidor.
Se eu não pagar os impostos,
Eu sou um sonegador.
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Se eu votar, sou eleitor,
Se eu revendo, muambeiro.
Em um comício, eu sou massa,
Na condução, passageiro.
Se não pago, inadimplente,
Que é o mesmo caloteiro.
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Se eu nunca tiver dinheiro,
Me chamam de pé rapado.
Na rua eu sou pedestre,
Mas se eu for atropelado,
A imprensa chama: a vitima,
O povão, o acidentado.
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Se eu vendo algo importado,
Contrabandista, que horror.
Se eu compro ou leio um livro,
Sou chamado de leitor.
Espectador para o ibope,
TV, telespectador.
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Já encerrando, o doutor
Disse, em tom bem compassado.
Ao morrer, tu és defunto,
Presunto, extinto ou finado.
Caso você seja espírita,
É só um desencarnado!
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Pesei que tinha encerrado,
Mas ele ainda acresceu.
Para os políticos você
É um imbecil, entendeu?
Ai disse o que eu devia
E eu não sei mais quem sou eu...
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Fim